sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Saneamento do Rio de Janeiro será privatizado, estrangeiros entram na disputa

A proposta de concessão do serviço de saneamento do Estado do Rio à iniciativa privada despertou o interesse das principais companhias que atuam no setor. A Aegea e a Águas do Brasil, entre as maiores do segmento e que já têm operações em municípios fluminenses, afirmam que vão participar da licitação. Dependendo dos termos finais do modelo, que ainda não está concluído, o processo deve atrair também grupos internacionais, segundo analistas.



O formato apresentado pelo BNDES ao governo do estado prevê dividir o Rio em quatro áreas geográficas para conceder a distribuição de água e os serviços de coleta e tratamento de esgoto. A Cedae continuaria a atuar na produção, tratamento e transporte de água até as adutoras. O projeto do banco usa o sistema de subsídio cruzado. Assim, a cidade do Rio será uma região âncora, na qual a tarifa cobrada pela água à concessionária custará mais caro, sem elevar o preço ao consumidor. Isso ajudaria a subsidiar as operações nas outras áreas.

— A Aegea tem apetite para levar uma ou todas as (quatro) regiões. A modelagem (da concessão) é inteligente e deve voar. Há vários países no mundo onde já é praticado algo semelhante, como em Portugal — afirma Hamilton Amadeo, presidente da companhia. — Temos hoje capacidade ilimitada de financiamento — diz ele, ponderando que a Aegea conta com recursos do Fundo Soberano de Cingapura e do fundo de investimento em infraestrutura ligado ao Banco Mundial.



A Aegea atua em 44 municípios do Brasil. No Rio, opera com a Prolagos, concessionária de água e esgoto em Cabo Frio, Búzios e São Pedro da Aldeia, além do serviço de água em Arraial do Cabo, todos municípios da Região dos Lagos. E, desde novembro de 2015, atua também na Baixada Fluminense, no serviço de esgoto de São João de Meriti. No primeiro semestre do ano, a Aegea registrou lucro de R$ 81,1 milhões, alta de 90% sobre janeiro a junho do ano passado.

— O modelo proposto pelo BNDES é lógico. Os serviços de água e esgoto têm de estar juntos porque isso torna a operação mais eficiente, tanto em agilidade de investimento quanto em redução de tarifas. É como um subsídio cruzado — destaca José Carlos Sussekind, presidente do conselho e um dos fundadores da Águas do Brasil.

As condições do edital, disse ele, vão determinar como será a participação na licitação da Cedae:

— A divisão em quatro regiões geográficas é sábia. Permite a participação de mais empresas e investidores. As condições vão dizer se investimos em uma, mais ou em todas as regiões.


CRISE FISCAL ESTIMULA ENTRADA DO SETOR PRIVADO

A Águas do Brasil está presente em 15 municípios do país, sendo dez deles no Rio, distribuídos em oito concessões. Águas de Niterói e Águas de Juturnaíba, que cobre Araruama, Saquarema e Silva Jardim, na Região dos Lagos, estão entre elas. As duas concessões cobrem os serviços de distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto.



Além das duas concessionárias que já confirmaram o interesse, outras empresas devem disputar a concessão fluminense, inclusive estrangeiras, segundo especialistas. A Odebrecht Ambiental — que atua ao lado da Águas do Brasil no saneamento de 21 bairros da cidade do Rio, por meio da Foz Águas — é citada. Informações de mercado, porém, apontam que ela está em negociação para ser vendida à canadense Brookfield. Procurada, a Odebrecht Ambiental não comentou.

A lista de possíveis interessados inclui ainda a GS Inima Brasil, subsidiária do Grupo GS, da Coreia do Sul, as francesas Suez e Veolia, e a espanhola Acciona. Para analistas, essas companhias poderiam investir sozinhas ou como integrantes de consórcios, ao lado de grupos nacionais.

— O modelo proposto não é novo. Mas oferece um pacote muito atraente. As grandes do setor no país vão entrar na disputa. A Aegea é a mais capitalizada. Mas estrangeiras como as japonesas Mistui e Mitsubishi já demonstraram interesse em saneamento. A espanhola Ferrovial também — destaca Jacy Prado, sócio da BF Capital.



Ele afirma já ter recebido consultas de ao menos quatro companhias do Japão sobre oportunidades em saneamento no Brasil.

No mercado, a divisão da concessão em quatro áreas é vista como um facilitador ao processo, já que a demanda em investimentos é robusta.

— A Cedae é uma empresa ineficiente. Ela é ruim em distribuição de água. Em esgoto, é péssima. Além disso, só na Região Metropolitana do Rio, seria preciso investir R$ 15 bilhões em esgoto. Mas, com a atual situação de caixa do estado, a participação privada é uma necessidade de ordem financeira — pontua Paulo Canedo, coordenador do Laboratório de Hidrologia da Coppe/UFRJ.

Para ele, as experiências em áreas concedidas à iniciativa privada mostram avanço, mas também pedem controle rígido:

— Não é ótimo, ainda não é bom, mas já é melhor. Mas é preciso criar mecanismos para garantir que se fará uma troca eficiente, com condições contratuais e metas pré-definidas a serem cumpridas. O controle social seria fundamental.



Para o presidente do Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Sindcon), Alexandre Lopes, o incentivo do governo federal às negociações por meio das empresas estaduais pode ajudar a estimular este mercado das parcerias público-privadas.

— A maioria dos contratos até agora era negociado município por município. Quando o governo federal quer estimular as parcerias com as empresas estaduais, abre a possibilidade de licitações que envolvam mais cidades — afirma Lopes, ponderando que é preciso conhecer as condições da proposta.

A cautela é compartilhada pelo sócio da GO Associados, Pedro Scazufca, embora o interesse seja forte. O crescimento expressivo das companhias nos últimos anos, segundo ele, explica o interesse:

— As empresas cresceram muito e têm potencial para crescer mais. Elas adquiriram concessões, se fortaleceram e têm apetite para investir.

A economista da área de projetos e pareceres da Tendências Consultoria, Carla Rossi, ressalta que a participação do setor privado no saneamento básico ainda é muito baixa, uma das menores entre os setores da infraestrutura, o que sugere o potencial existente. Segundo a Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), são apenas 316 municípios brasileiros com participação privada, ou 5% do total.

— Um dos estímulos para a entrada mais agressiva do setor privado no saneamento é a questão fiscal. Municípios e estados vivem uma falência das finanças públicas, sem capacidade de investir. E a situação do saneamento é muito precária no país — diz Carla.


FONTE: O Globo

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