quarta-feira, 22 de junho de 2016

Bolsonaro vira réu no STF por "não estuprar uma mulher"

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (21) abrir duas ações penais contra o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Com a decisão, o deputado se torna réu na Corte pela suposta prática de apologia ao crime e por injúria. Em 2014, Bolsonaro afirmou, na Câmara e em entrevista a jornal, que a deputada Maria do Rosário (PT-RS) não merecia ser estuprada.




Ao analisar denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) e queixa da própria deputada, a Primeira Turma da Corte entendeu, por quatro votos a um, que além de incitar a prática do estupro, Bolsonaro ofendeu a honra da colega. Somente o ministro Marco Aurélio Mello foi contra a abertura das ações penais. Os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Roberto Barroso votaram favor de que Bolsonaro se torne réu.

A declaração de Bolsonaro que motivou a denúncia foi feita após discurso de Maria do Rosário em defesa das supostas vítimas da ditadura militar (1964-1985). Bolsonaro, que é militar da reserva, subiu à tribuna da Câmara para criticar a fala da deputada. Quando Maria do Rosário deixava o plenário, Bolsonaro falou: "Fica aí, Maria do Rosário, fica. Há poucos dias, tu me chamou de estuprador, [...] e eu falei que não ia estuprar você porque você não merece. Fica aqui pra ouvir", disse o parlamentar, repetindo o que havia dito a ela em 2003, em discussão na Câmara.


Defesa

Na defesa, a advogada de Bolsonaro, Lígia Regina de Oliveira Martan, invocou a chamada "imunidade parlamentar", que protege deputados e senadores por opiniões, palavras e votos. Além disso, afirmou que ele não incentivou outras pessoas a estuprar.

"Ele é conhecido por projetos de lei que tendem a aumentar as penas de crimes e para que condenado por crime sexual deve ser submetido a castração química para obter benefícios. É uma mentira insinuar que o deputado tenha incitado a prática de qualquer crime", ressaltou a advogada.




Ao rebater a acusação de que Bolsonaro incentiva, com suas falas, a prática de estupro, a advogada disse que o deputado não poderia ser responsabilizado, por exemplo, pelo estupro coletivo do Rio de Janeiro, ocorrido recentemente. "Ele não participou do crime. Não há como dizer que o número de estupros no Brasil aumentou após as declarações", afirmou.
A decisão desta terça-feira de abrir a ação penal não significa uma condenação pelos crimes, mas sim que Bolsonaro passa a ser considerado formalmente acusado no caso. Só ao final do processo, e após novas chances de defesa, a Primeira Turma poderá ou não considerá-lo culpado.

Após a decisão do Supremo, Bolsonaro afirmou na Câmara que a afirmação dele foi um "ato-reflexo" e que a sociedade precisa ser informada sobre a verdade dos fatos. "Vou ser realmente julgado pelo Supremo Tribunal Federal, basicamente, por apologia ao estupro. Foi uma retorsão o que eu falei para ela [deputada], foi um ato-reflexo. As desculpas que eu peço é para a sociedade, que foi desinformada sobre a verdade dos fatos", disse Bolsonaro.

Em nota, Maria do Rosário afirmou que a decisão do STF é uma "vitória" contra a impunidade para as mulheres e para as vítimas de violência. A deputada agradeceu à bancada feminina do Congresso e aos movimentos feministas que a apoiaram diante da declaração de Bolsonaro. "Essa não é apenas uma resposta para a sua ação em si, mas uma importante afirmação de que a lei é para todos, independentemente do cargo ou posição de poder", declarou a deputada em nota.


Voto do relator

Relator do caso, o ministro Luiz Fux argumentou que as falas de Bolsonaro representam desprezo pelas vítimas de estupro, no sentido de que teriam sido violentadas porque mereceriam. Em seu voto, ele também citou frases de apoiadores do deputado publicadas em redes sociais afirmando que estuprariam a deputada.




“A manifestação teve o potencial de incitar homens a vulnerar a fragilidade de outras mulheres […]. ‘Se ela merecesse, eu estupraria’. É o que está dito em suas palavras implicitamente. Então, deve haver merecimento para ser vítima de estupro. As palavras do parlamentar podem ser interpretadas no sentido de que uma mulher não merece ser estuprada se é feia. Estaria em posição de avaliar quando a mulher mereceria ser estuprada. Atribui às vítimas merecimento do sofrimento que lhe seja infligido”, afirmou.

Acompanharam Fux os ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso.
Único ministro a divergir, Marco Aurélio Mello lembrou que a fala de Bolsonaro foi dada em resposta a Maria do Rosário, que o chamou de estuprador, quando ele defendia penas maiores para condenados por violência sexual.

“Precisamos considerar o contexto, que inicialmente se apontou que Bolsonaro seria um estuprador. E ele tão somente se defendeu. Se defendeu estarrecido de ser enquadrado como tal e acrescentou que não a estupraria. […] O que tivemos aqui foi arroubo de retórica”, afirmou.


Denúncia

A denúncia contra Bolsonaro por suposta apologia ao crime foi apresentada em dezembro de 2014 pela vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko. A acusação faz referência a declarações em plenário (veja vídeo abaixo) e ao jornal “Zero Hora” sobre a deputada Maria do Rosário (PT-RS). Caso condenado, Bolsonaro pode ser punido com pena de 3 a 6 meses de prisão, mais multa.




Dias depois da primeira declaração de Bolsonaro em que ele criticou Maria do Rosário, numa entrevista ao jornal “Zero Hora” ele justificou a fala. “Ela não merece porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece”, disse o deputado.
Para a procuradora Ela Wiecko, “ao dizer que não estupraria a deputada porque ela não ‘merece’, o denunciado instigou, com suas palavras, que um homem pode estuprar uma mulher que escolha e que ele entenda ser merecedora do estupro”.

A vice-procuradora diz, ainda, que Bolsonaro “abalou a sensação coletiva de segurança e tranquilidade, garantida pela ordem jurídica a todas as mulheres, de que não serão vítimas de estupro porque tal prática é coibida pela legislação penal”, segundo informou a PGR.


FONTE: G1 Globo

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